Muito se discute sobre a garantia de produtos e serviços. Dúvidas acerca de prazo, abrangência dentre outras são freqüentes.
Primeiramente cumpre esclarecer que temos dois tipos de garantia, aquela dita legal, ou seja decorrente de Lei e a Contratual que decorre de contrato entre as partes.
Em se tratando de relação de consumo, a garantia está prevista no artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor. Neste artigo distinguem-se dois prazos, quais sejam:
30 dias – para produtos e serviços não duráveis
90 dias – para produtos e serviços duráveis
Produtos não duráveis, são aqueles de consumo imediato, que basicamente se resumem a produtos perecíveis como alimentos, remédios e outros. Já os produtos duráveis são os que perduram no tempo, um veículo por exemplo.
Quanto à contagem deste prazo, primeiro temos que diferenciar vício aparente de vício oculto.
O vício aparente é aquele de fácil constatação pelo consumidor médio. Isto é aquele que é possível ser identificado por uma pessoa sem conhecimentos técnicos sobre o assunto. Já o vício oculto é aquele que não é perceptível de imediato pelo consumidor. Um exemplo de vício oculto é um problema por exemplo no cooler do computador que irá levar a queima prematura da placa. Apenas uma pessoa com conhecimento de informática seria capaz de atestar que esta peça está com problemas. Neste caso estaremos diante de um vício oculto.
Feita a distinção, para os vícios aparentes o prazo de trinta ou noventa dias (produtos não duráveis e produtos duráveis respectivamente) conta-se a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.
Já no caso dos vícios ocultos o prazo começa a fluir no momento em que ficar evidenciado o defeito.
Esta garantia não pode ser afastada, não depende de vontade do fornecedor nem de aceitação do consumidor. Esta garantia também compreende o todo do produto ou de serviço, não podendo apenas incluir esta ou aquela peça.
Já a garantia contratual é aquela dada pelo fornecedor mediante contato. A garantia contratual é mera liberalidade do fornecedor, cabendo a ela concedê-la ou não. Ao contrário da garantia legal, na garantia contratual é permitido ao fornecedor incluir local, prazos, partes englobadas, ônus a cargo do consumidor e outras condições. Tal garantia esta prevista no artigo 50 do Código de Defesa do Consumidor, sendo que será conferida mediante termo escrito.
A fim de facilitar a visualização colocaremos as duas em quadro:
GARANTIA LEGAL |
GARANTIA CONTRATUAL |
Vedada exoneração – Obrigatória |
Não obrigatória |
Independe de termo expresso |
Conferida por termo escrito |
Abrange o todo |
Não possui limitações quanto a cobertura |
Prazo definido em Lei (30 ou 90 dias) |
Prazo estipulado pelas partes |
Questão dificultosa se coloca ao aplicarmos as duas garantias ao mesmo produto ou serviço. Neste caso existem duas correntes:
A primeira corrente entende que a garantia legal é anterior a garantia contratual e apenas após o escoamento do prazo da garantia legal é que começa a contagem do prazo da garantia contratual. Este é o posicionamento da Fundação Procon em São Paulo.
A segunda corrente entende ser primeiro o escoamento de prazo da garantia contratual para que assim comece a fluir o prazo da garantia legal.
Acreditamos ser mais correta o posicionamento da primeira corrente, também adotada pela Fundação Procon/SP, uma vez que o artigo 50 menciona que a garantia contratual é complementar à legal.
De qualquer forma, o Fornecedor mais precavido redige (lembrando que a garantia contratual deve ser por termo escrito) uma garantia em que coloca a “garantia deste produto é de um ano, sendo: 90 dias de garantia legal e 275 de garantia contratual”. Uma simples frase no termo de garantia poderia evitar uma enxurrada de reclamações perante os órgãos de defesa do consumidor.
Não esquecendo de que a garantia contratual, deve ser conferida mediante termo que deverá ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.
Apenas para finalizar cabe lembrar aos revendedores de carros usados, que a praxe de colocar “garantia de três meses de motos e câmbio” não se aplica uma vez que a garantia legal compreende o todo e é vedada sua exoneração. Finalizado o prazo legal de 90 dias, aí sim é possível estabelecer a garantia apenas para motor e câmbio, caso em que estaria vigorando a garantia contratual.
Beatriz Inojosa Silva
Advogada - OAB/SP 252.753